sexta-feira, 21 de março de 2008

Sexta-Feira Santa

A sexta-feira santa é um dia, no mínimo, estranho para quem vive entre católicos praticantes. O respeito à morte de Cristo, principalmente em cidadezinhas do interior, é coisa séria.

Durante a minha vida já ouvi cada coisa (a maioria absurda) sobre a sexta-feira santa. Não se come carne vermelha, não se faz festa, não isso, não aquilo. Falando com pessoas mais velhas então, descobre-se que as proibições eram ainda maiores há tempos atrás. Um senhor de cinqüenta e poucos anos uma vez confessou que seus pais falavam que quem não respeita a sexta-feira santa amanhece no sábado com um rabo. Sim um rabo. Nasce um rabo na pessoa durante a noite. Confessou-me, ainda, que, no sábado, quando acordava a primeira coisa que fazia era conferir se não havia algo estranho em seu traseiro.

O pior é que aqui na cidade a grande maioria da população é católica. Como a cidade é pequena todo mundo se vigia. Logo, ninguém faz nada na sexta-feira santa. Não sai pelada, não sai churrasco, não sai festa, ninguém trabalha porque é feriado, ninguém faz nada.

Talvez por isso cá estou eu, escrevendo. O blog, que anda em marcha lenta, ganha mais um texto. Depois vou arrumar o que fazer. Respeito a morte de Cristo, mas não tem como não fazer nada. Não sei como me portar na sexta-feira santa. Meu medo é acordar amanhã e ter uma surpresa.

quinta-feira, 20 de março de 2008

Satisfação Literária

“...No jardim, Clara ressurgia a meu lado, plena de vida, sussurrando algum segredo. Meu pai desaprovou o encontro. Nem liguei. Enquanto punha meu braço na cintura dela, beliscava-lhe as nádegas fartas. Ela gostava. Ah! Como sorri bonito. Claro, eu acharia um jeito de roubar-lhe um beijo, sem que o marido desconfiasse. Era só preciso cuidado. Sabia-o ciumento, capaz de desvarios.
- Você parece um noivo – piscou – ainda pensa em casar?
- É muito difícil encontrar outra igual. – Enfiei meus dedos entre seus cabelos louros.
- Ainda gosta de mim?
Confirmei com a cabeça. Meu pai e seus mortos estavam com pressa. Atraíam-me à rua.
- Como vocês vivem? – voltei a olhar para a porta. Vi o marido na janela, mordendo os lábios.
- Estamos separados há um ano. – Ela baixou os olhos, disfarçando a lágrima denunciadora. – Sempre desconfiou de ti e fez de nossa vida um inferno.
Será que ainda gostava dele?
Desabafou:
- Quero o desquite, mas ele recusa. E não sai do meu pé.
- Então posso ter esperanças?
Consentiu com um sorriso. E antevi o que era ir ao céu.
Ouvi meu pai dizer qualquer coisa parecida com “agora é muito tarde”. Os parentes pálidos fizeram um silêncio intenso, gelado. Retruquei meu pai: eu casaria com ela, de qualquer jeito. Mataria o marido, brigaria com o mundo, faria qualquer coisa para ter Clara comigo e recuperar o tempo. Ninguém me impediria.
Meu pai estendeu-me suas mãos:
- Vem comigo!
O estampido muito próximo ecoou em meus ouvidos. Parecia um míssil em chamas que me atravessava a cabeça. O branco do céu tingia-se de vermelho, enquanto um sono doloroso pesava em minhas pálpebras. Ainda vi Clara correndo pra mim, chamando meu nome, nua, na praia de Garopaba, no verão de setenta e quatro. Em meus lábios um beijo de areia quente, com gosto de água salgada.”

Esses dias, sem ter o que fazer, procurando um livro para ler peguei um, quase ao acaso, na estante de casa. O Paraíso é no Céu de Sua Boca. Walmor Santos. Um livro de contos. Conforme fui lendo, fui me interessando. Estava naqueles dias em que precisava de uma boa leitura. Quando li o conto descrito acima (Clara nua, chamando meu nome) cheguei ao ápice da minha satisfação. Fechei o livro e fui dormir. Nada como estar satisfeito literalmente.

*. Encontrei alguns contos de Walmor Santos na Revista Malagueta que, a propósito, tem mais alguns textos e crônicas interessantes.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Falta Violenta é pra Cartão!

As aulas entraram de carrinho com os dois pés me deixando estendido no gramado. Somente agora, após a saída de campo e o atendimento médico, consegui levantar e reclamar cartão pela entrada violenta.

Estava com a posse de bola numa partida tranqüila, apenas esperando o apito final. Não tive tempo nem de pensar em me defender. O que parecia tão distante ocorreu. Anteontem estava na praia. Ontem no carnaval. Hoje estou cercado e imobilizado pela faculdade. Afinal, por que as férias passam num ritmo alucinante e o ano letivo é um parto com sérias complicações? Talvez tudo ocorra numa velocidade diretamente proporcional à empregada em cada situação. Agora que estou me dedicando um pouco mais (entenda-se pouquíssimo mais) parece que o tempo está passando um pouco mais rápido neste início de ano letivo. A vida ensina: não adianta ser craque, é preciso ajudar na marcação também.

Ainda estou meio atordoado. Atrás de livros. Situando-me nos estudos. Mas já deu pra ter uma palhinha de como vai ser o “campeonato” esse ano. Depois dessas partidas iniciais e da violência com que fui recebido, vou alegar um desconforto muscular e pedir pro “professor” pra ser poupado nas próximas partidas.

sábado, 1 de março de 2008

Felicidade Pura

Estou bem. Nos últimos dias fui invadido de uma alegria existencial que raras vezes me ataca. Logo eu um apaixonado pela melancolia, pela alegria de estar triste. Agora me encontro feliz sem estar triste por isso. Eu não entendo. Definitivamente, não entendo.

Muitas vezes estou feliz sem estar feliz. É uma felicidade mentirosa. Mascarada. Poluída por algum sentimento que não me permite estar definitivamente feliz. Hoje não. Estou feliz. Somente feliz. Puramente feliz. É isso.