sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Noite de Despedida

Jamais haviam trocado um olhar malicioso. Aquela era uma noite de despedida e essas noites exercem uma força estranha sobre seus protagonistas. Possuem roteiros ousados que surpreendem seus atores e geralmente são revelados na última hora. A mulher, uma amiga dele. Melhor amiga de sua ex. A ex, presente na festa, lançava olhares sobre ele por mais que estivesse acompanhada de outro. Esse outro é figurante na história, assim como a ex que está na história só para lançar esse olhar e confundir inicialmente o leitor. Ele ignora tais olhares.

Esta história não é sobre ele e sua ex. Isso nem ele sabe. A história é sobre ele e a amiga de sua ex e sobre como eles fazem sexo na noite de sua despedida. Ela ia para a capital durante a semana. Era sua última festa com os amigos antes da mudança de ambiente.

A festa transcorria normalmente. Até então, como sempre ocorreu ou como nunca ocorreu, ele e ela não haviam trocado olhares na festa. Entre uma despedida e outra eles se encontraram. Começaram a conversar e quase que sem querer trocaram olhares. Pela primeira vez se olharam assim. Olharam-se fundo. Um olhar de desejo. Somente nesse momento ele recebe o roteiro, vai direto ler o final e acha interessante. “Por que não?” Ela desvia o olhar e sai. Continua se despedindo do resto do pessoal.

Ele continua bebendo. Está sozinho. Não pensa e não faz nada além de beber. De agora em diante é apenas um marionete nas mãos do autor. O autor sabe dos efeitos de uma noite de despedida e deixa o protagonista em suas mãos.

Como que atraído por uma força vira-se pro lado. Lá está ela, parada, próxima da saída. Em seu vestido preto, bolsa na mão e olhando-o novamente. Novamente aquele olhar de desejo. Aquele olhar que fala. Convidando ele para sair. Para pular algumas páginas do roteiro e ir logo para o final. Ele olhando para ela daquela maneira pela segunda vez na sua vida sabia que não olharia uma terceira. Não naquela noite. Ela, concordando com a escolha, sai rasgando e atirando ao fogo as páginas intermediárias sendo seguida por ele.

Os dois vão para um local escuro bem próximo da festa. Dessa vez não houve carro motel ou cama, afinal era uma noite de despedida. Como se fizessem isso junto há anos, transaram numa sintonia nunca experimentada por nenhum deles. O palco foi o mais simples possível, escolhido naturalmente: a grama banhada pelo orvalho da noite.

Após aquela noite ela viajou como planejado. Ele ficou como esperado. Viram-se poucas vezes desde então. Nunca comentaram aquela noite. Nenhum dos dois entendeu direito o que aconteceu naquele dia. O que se sabe é que nunca mais ele participou de uma noite de despedida.